sexta-feira, 8 de setembro de 2017

"Teu silêncio tem um preço alto", o bispo Tutu alerta Aung San Suu Kyi

Diante da perseguição e fuga da minoria muçulmana rohingya sob pressão do Exército de Mianmar, o arcebispo Desmond Tutu, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1984 pela luta contra o regime segregacionista do apartheid na África do Sul, enviou uma carta advertindo a líder do movimento pela democratização do país, Aung San Suu Kyi, ganhadora do Nobel da Paz em 1991: "Teu silêncio tem um preço muto alto."

Para o bispo Tutu, o "horror" e "limpeza étnica" no estado de Rakhine, com uma fuga que pode chegar a 300 mil rohingyas para o vizinho e miserável Bangladesh, o obrigou a escrever para a mulher que se acostumou a chamar de "minha querida e amada irmã".

O Exército realiza uma operação punitiva desde 25 de agosto, quando o grupo rebelde Exército de Salvação Rohingya Arakan atacou vários postos policiais. As Nações Unidas estimam que o total de mortos passe de mil.

Suu Kyi, filha de Aung San, líder da independência da Birmânia do Império Britânico, em 1948, se tornou o maior símbolo da luta pela democracia contra uma ditadura militar que embruteceu e empobreceu o país desde 1962.

Em 1990, sua Liga Nacional pela Democracia obteve uma vitória eleitoral esmagadora. Os militares anularam o resultado e mantiveram Suu Kyi em prisão domiciliar durante 15 anos. Cinco anos depois de ser libertada, ele liderou a LND à vitória nas primeiras eleições, em 2015.

Desde então, proibida de governar o país por uma lei feita sob medida pela ditadura por ter sido casada com um estrangeiro (britânico), é o poder por trás do trono como Primeira Conselheira do Estado. Teve de fazer concessões os militares, que aparentemente continuam tendo carta branca para atacar as inúmeras minorias étnicas de Mianmar.

Pelo menos 13 grupos armados aderiram a um cessar-fogo, mas cinco continuam ativos. A situação do povo rohingya, muçulmano, massacrado e perseguido pelo Exército da maioria budista, é a mais trágica.

Acusada de omissão, Suu Kyi desqualificou as denúncias de violações dos direitos humanos como "desinformação" e chamou os rohingyas de "terroristas".

"Sou agora velho, decrépito e formalmente aposentado, mas quebro meu voto de permanecer em silêncio sobre questões públicas por causa de uma tristeza profunda", escreveu Tutu.

"Durante anos, tive uma fotografia sua na minha mesa para me lembrar da injustiça e do sacrifício que você suportou por causa de seu amor e compromisso com o povo de Mianmar. Você simbolizava a correção.

"Sua emergência na vida pública aliviou nossas preocupações sobre a violência perpetrada contra membros do povo rohingya. Mas o que alguns chamam de 'limpeza étnica' e outros de um 'genocídio lento' persistiu - e recentemente se acelerou.

"É incongruente para um símbolo da correção liderar um país assim", criticou o arcebispo sul-africano. "Se o preço político por sua ascensão aos mais altos cargos em Mianmar é o teu silêncio, é certamente um preço alto demais."

A mais jovem ganhadora do Nobel da Paz, a estudante paquistanesa Malafa Yousafzai, também fez um apelo a Suu Kyi: "Toda vez que vejo as notícias meu coração se parte. Nos últimos anos, condenei repetidamente esse tratamento trágico e vergonhoso. Ainda estou esperando que minha colega laureada com o Nobel Aung San Suu Kyi faça o mesmo."

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